Onde foi que me despendi ultimamente?
E que importância paguei
para nem encontrar meu troco,
os bolsos vazios?
Meu cofre de interesses trincou-se
(a porcelana fendida em cacos)
e não tenho mais onde
depositar o pouco proveito.
Vou despendendo minhas sensações,
gastando-me constantemente.
Exponho meu saldo:
estou falido, no prejuízo
do valor que não me dão.
Já nem dou conta deste fundo,
precárias horas sacadas
e desembolsadas por completo
no crediário da vida.
Exercício esquizofrênico:
entregue à busca dos limites
desta vida onde me instalo.
Pois sou de uma contenção
ferocíssima,
o dia todo dentro.
Pois careço
da alforria do ser;
ser
um cariz novo
que exista
exatamente.
Um cerne expurgado
de tudo o que lesa,
de todo o medo
que medra
entre os dias.
E enfim,
encontrar a mim mesmo:
homem superlativo,
a contento.
(autorretrato do homem de óculos)
A linguagem me perfaz.
Palavras se reconhecem na minha língua,
expandem-se na saliva,
glossolalia compondo mil dialetos
num sussurro de alvoroço.
Os fatos e espalhafatos da escrita
descascam-se de mim
como cortiça, irrompem
do harém da ideia e se fazem
a peripécia de uma rosa mística
florescendo na superfície branca.
Escrevo em off
: sou melhor no papel, aqui
reescrevo, aprimoro, apuro.
Caminho pela vida
(latifúndio de acasos sem mapa)
digitando pegadas de frases
: pessoas param para ler meus rastros,
medindo suas mãos nos pingos dos meus Is.
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