segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012 24 comentários

'Poiesis'



)
À la carte para o leitor
(

A poesia tornou-se performance,
um duelo sem muitos direitos:
a última do Lácio não é mais flor.
Sobre o pavimento da folha
(este pedaço de todas as interrogações),
o único expediente
é recuperar a palavra
dispersa na mídia hansênica.

Acima do discurso tísico
deste milênio que estreia,
fazer poesia
é inventar a carne.


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012 28 comentários

Festim


Antes que se faça cinza a quarta-feira;
que o batuque se recolha ao silêncio,
transitório e quaresmal;
que o colorido das fantasias se tolde
no fosco ecumênico de todo dia,
quiçá essa inquietação acabe e me dê
a sensação de haurir o que é preciso:
a semana, o mês, o ano prossegue estritamente,
e o cansaço já me veste 
em seus trajes frouxos.

Forasteiro desde sempre a todo esse folguedo,
vezes sem conta eu me (im)pus a máscara foliona:
mas o molejo é faltante, a malemolência falha,
e logo se percebe que tenho mais raízes que pés.
A gandaia se me faz pelos olhos de espectador,
o espocar imponderado dos tambores
surgindo como um susto à solta no peito,
meu admirar-me acriançado diante da veemência
corpórea dos passistas que se doam à polirritmia.
E Momo, esse se ri de minhas arlequinadas.


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012 22 comentários

Undíssona


Sua voz imerge em mim
no seu escafandro de som,
mergulhando
para além
de meus arrecifes
à tona,
das minhas marés revoltas.

Rumor
na arrebentação da onda,
sua voz
é preamar
vociferando
nos calcanhares da praia,
umedecendo de vagas fartas
o atol da orelha.

Sua voz é Jonas
e faz
dos meus ouvidos
sua baleia.


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012 22 comentários

Direção



sábado, 4 de fevereiro de 2012 22 comentários

Da litocronia


As pedras escorregadiças, 
lustradas por anos de conflito. 
Aguerridas, iludem o tempo 
enfrentando-o de frente, 
minério contra o vento, 
contra a chuva, 
expondo todos os achaques 
e tormentas que esfolam 
cada aresta com um toque 
não muito distinto do de um Michelangelo. 

Ainda assim, o ar 
é teimoso em sua insistência: 
quer assinalar as pedras 
com a rubrica do envelhecimento, 
como um encarcerado 
que decompõe a idade que lhe resta 
em linhas e traços. Quando o sol 
começa sua descida lenta, 
ornando o ar de ouro e cinabre, 
as pedras recortam a paisagem, 
severas e estoicas, sem saber 
que somos nós 
os interinos no crepúsculo.

 
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