À janela,
como James Stewart no filme do Hitchcock.
Deixo meus olhos disponíveis
e inauguro a temporada de observação“comme il faut”.
A cidade é explícita
e não se faz de rogada,
revela-se toda.
A poluição que a veste
é uma forma dela se dizer,
uma apresentação.
Questão de personalidade,
de inerência. Porém,
e talvez por isso,
o verde prospera violentamente,
seduzindo a vista,
gulosa por sombra.
O amplexo dos bulevares
enche os pulmões de preguiça:
longos, lânguidos,
realçam o asfalto,
insinuando mistérios.
O que virá além da próxima curva?
O melhor que se faz aqui
é entregar-se às próprias pernas
e errar anônimo pelas ruas,
sem outra preocupação
que o repouso do espírito.
Isso proporciona a liberdade de movimento
que geralmente o trânsito subtrai ao passeante,
degradando-o a simples pedestre.
Passear é um ato gratuito -
sem desinteresse, não há contemplação.
E contemplar é o que se faz de melhor:
são muitos os rostos,
vindos de todas as partes,
Babel de origens.
Essa foi minha morada.
Cava e transfinita,
a cidade, à verve do texto,
se me impõe num ninho,
sob as imagens da retina.
(Volto à Ipatinga, 25 anos depois...
Cidade outra,
ainda que a memória a guarde,
mesma.)